terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Como Lisboa influenciou Gogol

Comentou-me uma cliente que, em Lisboa, lhe parecia ter visto muito personagem digno de livros de Gogol e Tchekov.
Sorri e limitei-me a educadamente ignorar os grandiosos planos de encerrarem as alas de psiquiatria dos nossos belos hospitais. Claro está que também a desmenti, começando desde logo a fazer contas mentais a fim de a desmentir.
Aqui neste canto da Graça onde habito só há o Preto do chapéu que fala sozinho ao fim de vários cartões de vinho, discutindo política de forma intensa com o seu "amigo", o do bigode que adopta em jardins públicos posições de fazer inveja ao family guy, o velhote corcunda que lê o expresso e carrega caixotes do lixo de um lado para o outro, um espadaúdo africano que consegue dormir nas mais estranhas e desconfortáveis posições nos muros do clara clara, o arrumador Raúl, oriundo de Badajoz e que recentemente lançou uma fatwa sobre um casal romeno, a senhora grande que repete ad infinitum "filho de uma granda vaca", o Alves que ameaça os clientes que não são do Benfica e que fala ao telemóvel no meio da estrada interrompendo frequentemente o trânsito, o senhor do lixo que cumprimenta e sorri a toda a gente que passa na rua mostrando o seu olhar esbórneo e os dentes podres, o drogado de olhar esbugalhado que tenta assaltar pessoas e que depois pede desculpa pelos sustos e maus jeitos, o buldogue francês que dá pulinhos maricas e o qualquer coisa velhote que me olha com um ar mais sapiete que a lagarta da Alice no País das Maravilhas.
Portanto, não vejo por aqui assim tantos personagens quanto isso e assumindo, como assumo, que o miradouro da Graça é um microcosmos de Lisboa, não haverá assim tantos por essas colinas fora.

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