terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

O falecimento a duas rodas

Ao fim de cerca de 7000 quilómetros a minha bicicleta que custou cinquenta euros resolveu, de forma incompreensível, falecer.
Da última vez que a tinha deixado na oficina a sentenca já lhe tinha sido lida sob forma de um ignominioso rótulo de veículo nao apto à circulacao que o mecanico lhes pos. Apesar disso, ainda se aguentou durante uns bons 400 quilómetros sem queixas de maior, tirando os pára-lamas partidos que rangiam que nem a Baixa Lisboeta aquando do terramoto de 1755, as mudancas estáticas impossíveis de alterar, o ondular dos pedais e a corrente enferrujada. Nada de mais, portanto.
No dia em que resolveu falecer o meu coracao encheu-se de lágrimas ao lembrar-me de todas as horas que partilhámos, dos esforcos e frustracoes que com ela vivenciei de forma sempre íntima e pessoal. Mas o destino é mesmo assim e, está bom de ver que se impos a necessidade de comprar uma substituta à qual me pudesse afeicoar de forma igualmente intensa e assim esquecer este doloroso momento de separacao.
Uma vez efectuada a compra, resolvi deixar a antiga bicicleta à sua sorte na rua e sem cadeado. Tres semanas e nada. Lá continuava, triste e solitária, olhando-me de forma incriminatória fazendo-me amiúde lembrar que talvez tenha sido eu que desisti dela e nao o contrário.
E eis que alguém a tentou levar. Mas nao foi longe. Duas casas mais abaixo foi abandonada contra o muro do jardim que a ladeava, lancando-me um olhar de terno desespero quando passei por ela a caminho da rotinária ida ao lixo. No regresso peguei nela e voltei a deixá-la junto das outras, novamente sem cadeado, mas com um carinho sem comparacao.
Uma semana semana mais se passou e ela lá continua, a fazer companhia à minha nova companheira numa convivencia que, espero, em breve seja de pacífica coabitacao.  Ou que alguém que a possa amar e dar nova vida a leve. O meu coracao agradecerá sorrindo como antigamente.