quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Nem tudo é mau

A fim de tentar eliminar da minha memória a amarga experiência gastronómica de Natal (a famosa salada de batata acompanhada de uma salsicha de tamanho anormal mergulhada em mostarda), decidi ir até ao cinema e ver o mais recente filme do Miguel Gomes, Tabu.
Tendo o filme sido apresentado em pleno feriado desta gente entre a qual vivo, a rondar a hora do jantar e num cinema alternativo perto de um campus universitário completamente rogado ao abandono por estudantes em férias, julgava eu poder encontrar o conforto da solidão da audiência de um bom filme português.
Não poderia estar mais enganado.
De supetão a sala encheu-se.
Umas cinquenta pessoas resolveram partilhar comigo esta traumática experiência. E eu que só queria um pouco de paz e silêncio lusitano para poder lamentar a falta do bacalhau, das couves e da farinheira. Até dos sonhos tive eu saudades...
Se soubessem eles que as minhas mais amadas ilusões são de coscorões feitas...
Pensei então que a comunidade portuguesa se tinha unido e, num claro manifesto contra os cortes orçamentais contra o cinema, tinha aqui dado uma verdadeira lição de acordo com os ditos do nosso presidente de que os emigrantes reforçam o prestígio nacional. Mas não podia eu estar mais enganado. Contando por alto o número de portugueses na sala, eis que consegui chegar à considerável soma de 3. Eu e o casal que estava na fila atrás. Todos os restantes tinham aqueles aspecto deslavado e branquela germânico tão característico destas chuvosas paisagens .
Querendo fugir desta tenebrosa realidade, eis-me num restaurante afegão fingindo ser apenas um cidadão do mundo que tem saudades do fabuloso palavreado lusitano perpetuado pelo Alves e restante trupe. Na mesa do lado um casal homossexual optou por algo mais carnívoro que eu e zás, vai de falar do filme e das implicações e traumas da guerra colonial na actual sociedade portuguesa.
Fugi então de novo rumo a uma casa de si tão pequena que nem máquina de lavar roupa tenho.
Problema?
Não.
O prédio disponibiliza numa cave digna dos anos da guerra uma sala onde há uma máquina de lavar comum onde, por euro e meio, se pode lavar a roupa. E secar? Nada de cidades de roupas estendidas nas varandas garantido coloridos onde por vezes pontuam cuecas gigantes e soutiens escabrosos que alimentam a imaginação e mais profundos desejos e fantasias dos transeuntes. Uma outra sala no sótão, igualmente comum, onde se podem pendurar as roupas com aquela confiança de que ninguém nos vai roubar a camisola da zara.
E assim sendo encaro o céu cinzento como um convite a mais uma cerveja ou um daqueles tais vinhos quentes que tanto servem para matar a saudade da casa materna e embrião do mundo, Lisboa.

 

3 comentários:

  1. Pois gostei, sim, embora me fizesse lembrar um pouco a Costa dos Murmurios (lamento a falta de acentos, mas estou em computador alemao...)

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  2. Só para que saibas e te sinta melhor, toda a gente adora a história da tua ceia de Natal! :P

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