Um dos horrores de todas estas gentes que frequentam os hostels é o ronco.
Dormir no quarto com um roncador que possua uns pulmões de fazer inveja ao Joaquim Agostinho é cenário digno do mais pesadelístico filme de terror.
E foi digno de filme de terror a forma como ontem acordei julgando que um tubo da cozinha se tinha roto. Onde é que vou arranjar um canalizador às três da manhã, pensei, aflito. Saio do quarto qual bombeiro sapador quando eis que me deparo com um francês a dormir no sofá da sala ao mesmo tempo que produzia um ronco tenebroso e delicadezas musicais de fazer inveja ao Stockhausen.
Também franceses eram os dois moços que no outro dia encontrei a dormir em torno dos matraquilhos. Logo me senti culpado de os ter esmagado sem dó nem piedade no dia anterior, obrigando-os a prestar vassalagem nocturna para se redimirem dos seus pecados. Depois de devidamente identificados através de um sofisticado sistema de fotografia, lá acordaram, queixando-se dos roncos de um colega de quarto, que os levou a abandonar o quarto e tentar a sala. Sendo que na sala ainda se ouvia, resolveram ir para a entrada do hostel dormir no chão aconchegados pelo calor sensual das pernas dos matrecos.
Mas, seja como for, nunca ninguém baterá o famoso belga que se ouvia por todo o hostel e que fazia reverberar ao de leve as janelas do quarto onde dormia.
Mas isso já são outras calendas...
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