Existe nestas terras que habito a saudável tradicao de quando um se quer livrar de coisas velhas, mete-las na rua com um papel a dizer: oferece-se.
Nao é pois de espantar que aqui e ali se encontrem as ruas povoadas com sofás desgastados pelas unhas de gatos, cadeiras mais coxas do que a minha pessoa a seguir a pouco saudáveis partidas de futebol ou móveis de contraplacado à espera que o tempo (metereológico e o outro mais simbólico da vida) os consumam até à mais ínfima essencia.
Razao?
O facto de se ter que pagar para serem recolhidos.
Assim sendo, os alemaes, tremendas criaturas da noite, abandonam os despojos que lhes complicam a vida sem qualquer tipo de pudor na via pública.
Contudo, por entre as imensas possibilidades que sempre se apresentam, há uma que sempre me agrada e choca ao mesmo tempo: o despojar de livros.
Que o preco de livros em segunda mao chega a ser ridículo ( a biblioteca central vende livros a um euro e o preco em feiras da ladra por cada um costuma rondar os 50 centimos) é algo que às vezes me aflige, mas largar livros de forma gratuita na rua?
Se por vezes lamento nao ter lareira de forma a que possa alimentar com os restos de armários ou estantes, penso se seria capaz de o fazer com livros. A resposta é mais ou menos óbvia e surge como um grito na minha cabeca: Nao! Penso entao se haverá pessoas que o facam aproveitando estas ofertas. Talvez sim. Talvez nao queira pensar muito nisso e continuar a ser um feliz ignorante.
Talvez me sinta no dever de os trazer para casa e alimentar a ilusao de que um dia os irei ler a todos, e que eles me irao alimentar a imaginacao e encher os cantos mais escuros da minha mente.
Ontem, ao regressar a casa trouxe comigo Garcia Márquez, Henning Mankel, uma versao simplificada do Corao e Kundera. Jantei com eles antes de os acomodar na sua nova cama.
Sejam benvindos, meninos